A proteção à penetração e propagação da água nos cabos ópticos é uma característica extremamente importante para o desempenho e tempo de vida das fibras ópticas, mas também afeta diretamente aspectos da sua instalação. É muito freqüente não ser levada em consideração pelos profissionais responsáveis pela definição e escolha dos cabos ópticos. Quando considerada surge então a dúvida: qual cabo óptico definir para implantar na rede, isto é: geleado, seco ou totalmente seco? Eis a questão para a qual que pretendo trazer algumas informações e opiniões.
Qual é o problema da presença de água no interior dos cabos ópticos?
Existem algumas situações onde o núcleo do cabo óptico e fibras podem ficar expostos à presença de água. Por exemplo, pode ocorrer uma abertura acidental da capa, por linha de pipa, roedor, abrasão com ferramenta de corte, etc. Outro ponto vulnerável são as caixas de emendas, que se não forem de boa qualidade e/ou mal montadas, podem beber água, conforme jargão utilizado pelo pessoal de campo.
O problema de água no interior dos cabos ópticos está relacionado com o desempenho das fibras ópticas. Importante recordarmos que as fibras ópticas são constituídas de um núcleo e uma casca de sílica vítrea, revestidas com duas camadas de resina acrílica, denominadas de revestimento primário.
Figura 1 – Estrutura da Fibra Óptica de Sílica (Monomodo e Multimodo)
A água é uma substancia altamente corrosiva para a sílica e sua presença é responsável pelo crescimento de microtrincas, que normalmente existem na superfície da casca de sílica das fibras ópticas. Este crescimento reduz a resistência mecânica das fibras ópticas e pode ser ainda mais crítico se estiverem sob tensão, como tração e/ou curvaturas, podendo levá-la a ruptura em curto espaço de tempo. A água também pode prejudicar a adesão do revestimento primário à sílica, causando microcurvaturas, que resultarão em aumento da atenuação óptica ao longo do tempo.
Figura 2 – Imagem da fratura de uma fibra óptica
Importante salientar que ocorreram importantes avanços tecnológicos, tanto nas características da sílica como do revestimento primário, nos últimos anos. Estes avanços, promovidos pelos principais fabricantes de fibras ópticas mundiais, resultaram em um expressivo aumento da resistência das fibras ópticas sob imersão em água. Mas mesmo assim ainda é fundamental manter a água afastada das fibras ópticas, que é conseguido através das apropriadas estruturas e materiais utilizados na fabricação dos cabos ópticos.
Os tipos de proteção à penetração de umidade
Os cabos ópticos mais amplamente utilizados atualmente são projetados e construídos utilizando-se a tecnologia denominada de tubo loose, que significa solto. Nesta tecnologia as fibras ópticas são alocadas no interior de um tubo, polimérico ou metálico, de forma que possam se movimentar, tanto lateralmente como longitudinalmente. Tubos metálicos são normalmente utilizados em cabos ópticos subaquáticos e pára-raios óptico OPGW, onde se requer elevada proteção mecânica, térmica e à penetração de água.
Figura 3- Cabo Óptico Dieléctrico Multitubos Loose
Existem atualmente dois tipos de materiais tipicamente utilizados para a proteção dos cabos quanto à penetração e propagação da água no seu interior: os compostos orgânicos na forma de gel e os materiais hidroexpansíveis, também conhecidos como water blocking.
Os materiais na forma de gel são compostos orgânicos não higroscópicos e que possuem elevada estabilidade de sua viscosidade em uma ampla faixa de temperatura, por exemplo, de -20oC a +65oC. A estabilidade da viscosidade é muito importante para o gel se manter no interior do tubo e também permitir a livre movimentação das fibras, até estes extremos de temperatura.
Os materiais hidroexpansíveis são polímeros superabsorventes de água, normalmente fabricados na forma de pó. Este polímero, na presença de água, se expande passando para um estado gelatinoso. Esta expansão, que pode chegar a 500 vezes seu volume, bloqueia os espaços livres no interior do cabo, impedindo a continuidade do ingresso e/ou propagação da água. Este polímero superabsorvente pode ser utilizado na forma de pó, mas normalmente é incorporado a fios e fitas, que são os materiais comumente utilizados na fabricação dos cabos ópticos.
Figura 4 – Cabo Óptico Multitubo Loose Seco
A estrutura de um cabo óptico pode então ser construída de três formas, segundo o tipo de proteção contra a umidade, conforme indicado na tabela a seguir:
Proteção do Cabo |
Geleado (G) | Seco (S) | Totalmente Seco (TS) |
Tubo Loose | Geleado | Geleado |
Seco |
Núcleo do cabo | Geleado | Seco |
Seco |
Nos cabos geleados, tanto os tubos loose como seus interstícios são preenchidos com o gel não higroscópico. Nos cabos secos, somente o interior dos tubos loose são geleados. O núcleo óptico é protegido com a utilização de fios e/ou fitas hidroexpansíveis. Já nos cabos totalmente seco, tanto o tubo loose como o núcleo óptico do cabo são protegidos com a utilização de fios e/ou fitas hidroexpansíveis.
Quais são as vantagens e desvantagens de cada alternativa?
Os cabos ópticos geleados, que utilizam o gel não higroscópico, tanto no interior dos tubos loose como entre eles, são os cabos mais bem protegidos contra a penetração e propagação da água. Todavia existe unanimidade entre os instaladores em ressaltar a grande dificuldade que enfrentam para a realização da limpeza do gel no núcleo do cabo, na fase de preparação para a montagem de uma caixa de emenda, distribuidor óptico, etc.
Os cabos secos são uma alternativa muito interessante, pois substitui o gel do núcleo óptico pelos materiais hidroexpansíveis, mas mantém no interior do tubo loose. A manutenção do gel no interior do tubo loose é, em minha opinião, uma característica extremamente importante. O gel no tubo loose desempenha alguns papeis bem relevantes, que vão além de simplesmente impedir a presença de água. Este material atua como um amortecedor à excessiva movimentação das fibras, tais como em caso de vibração do cabo, melhora o desempenho do tubo aos esforços mecânicos, como compressão e impacto, melhora o desempenho das fibras nos ciclos térmicos, etc.
Consultando novamente alguns instaladores, constatei que a limpeza das fibras nos tubos loose geleados não representa um grande problema ou dificuldade. Afirmam que o maior tempo gasto está na abertura do cabo geleado e na limpeza do núcleo óptico, que representa cerca de 90% a 95 % do tempo total. Apenas 5% a 10% são gastos para limpar e preparar as fibras do tubo geleado, para a realização da emenda por fusão.
Os cabos totalmente secos, que não utilizam nenhum tipo de gel, surgiram com a motivação de oferecer uma solução que propicia facilidade e velocidade na preparação do cabo, não requerendo qualquer tipo de produto para a limpeza do gel e reduzindo o tempo de preparação. Além disto, os cabos TS são mais leves, o que traz alguns benefícios para sua instalação, do ponto de vista de ferragens e impactos mecânicos na infra-estrutura. Porém, conforme constatamos, os ganhos de tempo e materiais de limpeza não são tão relevantes quando comparados com os cabos secos.
Comentários
Cabos Gelados são uma excelente alternativa para a proteção das fibras do ponto de vista da penetração e propagação da água. São altamente recomendados para cabos diretamente enterrados e em dutos, que poderão ficar submersos em água por grandes períodos de tempo. Por exemplo, todos os tipos de cabos subaquáticos são geleados.
Os cabos Secos são, na minha opinião, a melhor das alternativas, pois elimina o principal problema que é a limpeza externa dos tubos loose do núcleo do cabo, mas mantém a proteção as fibras no interior do tubo loose. São recomendados para a maioria das aplicações, tanto em dutos como e principalmente na rede aérea. Possuem um peso pouco menor que os geleados, trazendo benefícios para a sua instalação.
Os cabos Totalmente Secos são muito utilizados mundialmente e mais recentemente no Brasil, porém eu ainda tenho algumas restrições a esta alternativa, pelos seguintes aspectos:
1- As vantagens de redução de tempo de preparação do cabo não são significativas. Como comentamos a redução de tempo de preparação do cabo TS é da ordem de 5 a 10% do tempo total em relação ao cabo Seco.
2- Em caso de penetração de água, as fibras ficam mais sujeitas a ficarem em contato com a água que entrou no tubo e expandiu o polímero hidroabsorvente.
3- Por estarem totalmente soltas no interior do tubo, as fibras em um tubo seco ficam mais sujeitas a esforços mecânicos por vibração, como em cabos aéreos. Acredito que isto possa afetar a confiabilidade mecânica e tempo de vida da fibra, porém desconheço algum estudos que comprove este efeito.
4- Os cabos TS ficam mais susceptíveis a aumentos de atenuação das fibras por compressões laterais, impactos, dobramentos, curvaturas, etc., quando submetidos a níveis pouco superiores aos limites especificados. Recentemente um instalador me comentou ter observado aumentos de atenuação durante a instalação de cabos TS aéreos, principalmente nas ancoragens para realizar as curvaturas e mudanças de direção.
5- Para a acomodação das fibras nas bandejas, pode ocorrer uma dificuldade adicional devido à eletricidade estática nas fibras, que faz que elas se repilam e não fiquem agrupadas. Outro instalador me comentou que costuma passar um gel no grupo de fibras dos cabos TS para facilitar sua acomodação na bandeja. No caso dos tubos geleados, isto não é necessário.
6- Cabos TS são uma excelente alternativa para aplicações em ambientes internos, como em galerias, túneis, edificações, etc., nas quais são requeridas características de retardancia a chama, baixa emissão de fumaça e livre de compostos halogenados (LSZH).
Escrito por Marco A. Scocco – Setembro 2016